sábado, 1 de fevereiro de 2014

Omeprazol ou vitamina de mamão?



             Pobre mulher quarentona. Hoje solteira, separada do segundo casamento, com três filhos para criar. Na verdade são cinco filhos, sorte que dois moram com os pais. A rotina diária é estressante. Depois de um cansativo dia de afazeres doméstico e uma longa jornada de trabalho profissional, vai dormir tarde. Mas só depois que lava toda a louça e passa o pano na casa para ficar limpa.
Antes de se deitar, como se sofresse de algum distúrbio paranoico, só encontra descanso psicológico quanto insistentemente confere por inúmeras vezes se todas as portas e janelas estão devidamente trancadas. Depois de deitada, o sono demora a chegar, as lembranças vêm como um bombardeio de imagens dos acontecimentos do dia. São signos repletos de emoções e dor que passam por sua mente como quem pressiona o botão de retrocesso, no modo super-rápido, de uma aparelho de DVD.
O dia amanhece e a pobre mulher quarentona acorda pior do que foi dormir. Com o corpo todo pinicado e ardido por picadas de muriçocas, ela levanta com a impressão que à noite só foi proveitosa para que seu sangue servisse de alimento para as milhares de sanguessugas, agora gordas e pesadas que mal podem voar, passassem a noite lhe sugando. Com dores pelo corpo, por dormir acomodada entre um pequeno espaço de colchão que lhe restou depois de dividi-lo com os dois filhos menores, ela levanta para mais um dia de labuta.
O dia está claro, mas o sol ainda não deu o ar de sua graça. A quarentona vai até o banheiro para suas necessidades fisiológicas e higiene pessoal para rapidamente está de pé, bem em frente da porta da geladeira, para mais uma de suas piores tarefas de sua vida, que é ser posta à prova quanto a sua capacidade criativa em fazer milagre: preparar um café da manhã rápido e diferente do dia anterior para que não seja rejeitado pelos seus e vá trabalhar com a consciência pesada em saber que os filhos se alimentaram mal e passarão a manhã inteira com fome.  
Com as mãos ásperas de tanto detergente de lavar louça e sabão em pó de lavar roupa, a quarentona acaricia os filhos depois de um beijo de despedida na porta do colégio de onde segue para o seu trabalho. O ponto de ônibus está lotado. Apesar de passar muitos ônibus, são poucos os que lhes servem. Ela os aguarda aparentemente tranquila, mas na verdade está aflita, pois sabe que muitas das lotações que passarão ali, virão lotados, e, sequer, diminuirão a velocidade. É angustiante olhar para os olhos da quarentona, eles são reveladores do quanto sua vida é triste e sem esperança.
Ela olha aflita para o relógio que marca sete horas em ponto. Não tem jeito, chegará atrasada mais uma vez no emprego. Seu estômago dói. Ela lembra da gastrite nervosa que a incomoda todas os dias, lembra-se também que não tomou seu remédio, um comprimido de Omeprazol de 40mg que deveria ser tomado diariamente em jejum. Ora, ela sequer lembrou de tomou o seu próprio café da manhã.
Agora, mais aflita do que antes, ela abre a bolsa em busca do esquecido remédio e só encontra a cartela, sem comprimidos. Enquanto revira a bolsa em busca de dinheiro, ela levanta ligeiramente a cabeça na esperança de encontrar uma farmácia aberta. Percebe que só tem alguns tostões, é o que lhe restou depois de pagar todas as contas do mês e não dará para comprar o caríssimo remédio. Ela então se dirige a uma barraquinha de lanches, encostada na parada de ônibus, e como paliativo para o seu incômodo pergunta: “Moço, quanto custa uma vitamina de mamão?”

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